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Mantenham esses loucos presos!
Venho, em nome da normalidade, reclamar nossa luta pela harmonia social e bons padrões de comportamento. Nossa sociedade brigou incansavelmente para conseguir limpar-se e constituir-se digna, com pessoas de boa vontade e totais condições de respeito aos bons costumes, que necessito manifestar-me contra o absurdo que vêm chamando de luta.
Estamos aqui, em nome da manutenção da felicidade advinda da árdua batalha quotidiana, externar nossa indignação ante esse grupo inconsequente, que hasteia a duvidosa bandeira da igualdade, denominado “Movimento Antimanicomial”.
Esse discurso de inclusão é assustador. Como poderemos sair com nossa esposa e filhos num domingo ensolarado correndo o risco de encontrar um louco na rua? Como posso ir a um restaurante com a minha amante sabendo que uma das garçonetes pode ser uma recém saída de um hospício? Essas pessoas deveriam pensar na repercussão de seus atos e ideias antes de sair abraçadas a malucos e clamando para que eles saiam de suas jaulas.
Conclamo as bases que fazem o rosto de nossa modernidade – essa, tão inteligente e promissora. Senhores Psiquiatras, advogados, políticos, todos os defensores do progresso de nosso mundo, onde as pessoas podem viver tranquilas em seus lares e trabalhos.
Como podemos permitir que esses insanos saiam às ruas? Eles não são capazes de entender o significado de um trabalho honesto e vigoroso, que tanto significa em nossas vidas. Um trabalho tão gratificante que sacrificamos, por vezes, o bem estar de nossos familiares, não dando conta da própria existência de nossos filhos. Mas nós, pessoas normais, conseguimos entender que é para o bem, e que só o sacrifício vai nos levar à perfeição.
Como aceitar, meus caros, ao nosso redor, criaturas com uma vida sem limites sexuais, parecendo animais que acasalam por prazer e vontade momentânea, expondo de forma vil nossas vontades mais íntimas e sórdidas? Como seria asquerosa a vida sem a repressão!
Não existe argumento válido para desbancar um sistema que há séculos logra êxito. Não há como nos convencer que, após a solidificação de um sistema seguro e os avanços da medicina moderna, abandonar tudo isso e viver à sombra de um futuro incerto seja a melhor alternativa. Que os nomes “transtorno”, “doença”, “inadequação”, “desvio”, tão qualificadamente inseridos nos diagnósticos de nossa ciência psicológica nos soem como verdade e possamos manter os errados longe de nós.
Essa “Luta antimanicomial” deveria, sim, ser denominada “Conspiração antimanicomial”. Até quando ficaremos cegos até percebermos que defender tais ideias biltres é cavar a cova do nível de sociedade que passamos séculos para consolidar? Será tarde demais quando percebermos que estamos inseridos num pandemônio arquitetado por pessoas doentes?
Senhores distintos, pessoas de bem, pais e mães de família! Conclamo a todos para sairmos às ruas e fazer a nossa voz ser ouvida! Vamos dizer “não” aos pretensos defensores dessa anarquia velada! Façamos valer a força dos valores por nós arraigados! Se esses loucos (literalmente) creem que podem combater nossos direitos adquiridos, façamos o mesmo! Que fundemos o Movimento Anti-Antimanicomial!
Lutemos pela estabilidade. Lutemos para que possamos matar um mendigo ou um índio que nos incomoda, para que possamos jogar nossos filhos do alto de prédios, comprar nossa maconha e esquecer as pequenas mãos infantis que seguram as armas do tráfico, para que tenhamos nossos carros e computadores, nossas armas, e nossa poluição pois nos alimentamos dela hoje. Peguemos em armas para assassinar em nome de nosso Deus, em nome dos direitos humanos e em nome de nossos sobrenomes, pois sabemos o que é bom e o que é mau. Em nome de nossa pátria. Ora, os loucos não têm pátria, não entendem o significado de sujar as mãos de sangue para vencer o inimigo.
Peguemos as armas que a ciência nos dá em nome de nossa mediocridade e defendamos a bandeira da normalidade
Nossa liberdade depende de mantê-los presos.
Carpe Noctem. Enlouqueçamos.
P.S: Agradeço ao meu irmão, Tadeu (webmaster do blog Demo e Bonus Track), pelo convite feito. Amo você. E mande essa "reforma moral" p'ra puta que o pariu.
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