sexta-feira, 29 de maio de 2009

Demiurgo.

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Now playing on iTunes: Foo Fighters - All My Life
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Uma dona-de-casa submissa.
Um libertino apaixonado.
Um reacionário panfletário.
Um casal que não se comunica.
Um homem saudosista.
Helena de Troia.
Um palhaço tímido.
Um fracassado niilista.
Um samurai medíocre.
Uma idosa decepcionada.
Um triste cético...

Eu sou mesmo muito cruel com os personagens que crio.


Carpe Noctem. Amo vocês.


P.S.: Agradeço à Kallyne que (mesmo sem ter notado) trouxe o insight que me fez chegar a essa conclusão.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Arez.

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Now playing on iTunes: Foo Fighters - Doll
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Ela acorda cedo.

Dá um beijo na testa de seu marido que, ainda sonolento, vira a cara e continua a dormir.

Calça as chinelas, que já não possuem as cores de outrora. Passa pelo quarto dos filhos. Estão dormindo como belos anjos de pardas asas.

Ajeita sua camisola, checa se está composta o suficiente e abre a janela da cozinha. O céu de um cinza com tons de azul.

Como de costume, ela levantou-se antes do Sol levantar.

O casebre passa a ser invadido por quentes aromas. A manteiga que crepita na frigideira até encontrar o pão. O café novo que encontra a água. O algodão do uniforme que encontra o ferro de passar roupas.

Ela acorda o filho mais velho com um beijo. Ele vira a cara, geme, grunhe, mas não encontra rendenção. Levanta-se, puxa uma rota toalha e rasteja até o banho.

Aos poucos, a mesa simples ganha cores, sabores e aromas. A garrafa de café ganha aos seus pés pratos com bolachas baratas, ovos, fatias de queijo e mortadela. Milagreira, consegue fazer daquela conjuntura algo sedutor aos sentidos.

Acorda o filho mais novo, que se agarra ao seu pescoço. Ela sorri. puxa uma toalha ao seu ombro e leva o pequenino para o banho. O mais velho havia acabado de escovar os dentes e cede o espaço do banheiro.

Todos estão prontos, sentados à mesa. Nenhuma palavra é proferida, até que o patriarca surge. Carranca, cabelos molhados, porém despenteados.

Senta-se. Desvira um prato. Recolhe um garfo e uma faca do sofrido guardador de plástico. Observa atentamente o que a mesa lhe oferece. Ao seu comando, ela recolhe para ele duas fatias de mortadela, corta um ovo frito pela metade, reune algumas bolachas ao prato. Ela enche a xícara dele com o forte e enevoante café.

Após ter sido o quinhão do alfa devidamente extraído, todos se servem. Todos, menos ela. Após o desjejum, ele veste a parte de cima do uniforme, escova seus cabelos e sai de casa. A tentativa de beijo dela é abreviada pela esquiva dele.

Tange as crianças para fora de casa. Fecha as janelas e a porta de casa. Toma o mais novo pela mão. Estende a mão para o mais velho, que a recusa.

Seguem por um caminho de barro, atravessam uma rua de asfalto e singram pelo bairro nobre que é preciso percorrer para chegar à rua do colégio. Os três ficam silenciosamente maravilhados com todo aquele universo de residências grandes, muros altos, cães de raça, guaritas e automóveis.

Deixa seus pardos anjos na depredada portaria. O mais novo a abraça forte e ela o recompensa com um beijo estalado na testa. Quando ela procura o mais velho, ele já está longe, em franca correria, rumo ao que outrora poderia ser chamada de quadra esportiva. Ela deseja um bom-dia a ambos, pede para que retornem juntos para casa e inicia seu caminho inverso para casa.

Abre a porta. Deixa o sol entrar por todas as janelas. Belisca o que restou do café e do pão com manteiga. Nenhum dos dois está fumegando como antes. Muito do sabor que havia pela manhã se perdeu.

Junta os restos e põe num prato. Guarda tudo numa velha geladeira azul. Joga o resto do frio café pelo ralo, lava toda a louça do café da manhã. Liga o rádio à pilha e, entre um chiado e outro, capta a beleza das músicas que dissertam sobre juras de amor eterno, apaixonados que não se esquecem nunca do outro. Canta todas as letras à sua maneira. Suspira à voz do locutor, fiel companheiro de todas as manhãs. Mas ainda encontra tempo para lamentar as letras tristes a falar de traição, distância e relações que se perderam.

Hoje é sexta-feira, mas há muito isso já não faz diferença alguma.

Após lavar a louça do café, é hora de pensar no almoço. Põe um pedaço de carne congelada em cima da pia. Ela avalia que terá de preparar um pouco mais de arroz. O feijão precisa ser apenas requentado, já que o marido não virá comer hoje. Esquenta água, corta, tempera, corta, descongela, salga... A vizinha aparece para pedir uma cebola emprestada. Do lado de fora, cantarola um trecho da música que toca na rádio. Agradece pela cebola e passa cerca de quinze minutos a queixar-se de comportamentos do marido. Ouvindo atentamente cada palavra, ela tenta, baseada em seus tantos anos atada ao matrimônio, aconselhar a vizinha. Ela agradece e retorna à sua casa.

Ela aproveita o sol inclemente para bater algumas roupas no tanque, pô-las de molho e estendê-las no varal do quintal.

Entre panelas, jarra de suco e frigideira, o almoço está pronto. Ela reduz o volume do rádio e recosta-se sobre o sofá reencapado.

Assim que os seus olhos se fecham, ouve o belo e ensurdecedor som de seus filhos, suados, sujos de barro e famintos. Após muito arguir, eles se convencem a tomar um breve banho, para então abocanhar a deliciosa refeição feito dois pequenos bárbaros.

Após o almoço, o filho mais velho corre com seus amigos em direção ao campo de futebol, o que prometia mais uma parelha de roupas sujas de barro ao cair da tarde. O filho mais novo fora convidado por outro garoto da rua para assistir a desenhos animados.

Enquanto isso, ela retira as roupas do varal. Arma a tábua e liga o ferro na tomada. Passa. Dobra. Passa. Dobra. Passa. Dobra. Guarda.

Retira as sobras do café da manhã de dentro da geladeira. Frita mais dois ovos. Assa mais pães. Prepara outra garrafa de café.

O céu escurece. Ela preocupa-se com os horários de seus filhos. Vai atrás do mais novo que, após um ensaio de choro, concorda em retornar para casa. Poucos minutos depois, o mais velho surge, com o já esperado barro encruando até a alma. Novos apelos negados - Era hora de mais um banho.

Jantar à mesa. Ela espera a chegada do marido, que tarda. Ela passa algumas horas com a cabeça para fora da janela, enquanto as luzes dos postes improvisados se acendiam e a comida esfriava.

Compadecida pelas crianças, ela as autoriza a jantar. Eles devoram a refeição calados.

O filho mais velho brinca um pouco na rua e retorna relativamente cedo. Reclama estar cansado e corre para o quarto.

Ela permanecia vigilante na sala. O filho mais novo tenta acompanhá-la na vigília. Ele ainda não chegou.

Chega a madrugada.


Ela liga o rádio, deixando o volume baixo como estava. Uma sequência de canções românticas a enternece, bem como a voz do seu tão-fiel locutor.

O filho mais novo dorme no sofá, num sono tão gostoso que à ela dá pena retirá-lo dali. As horas passam.

Ela ainda está alerta. Agoniada. Pensando em todos os maus motivos para explicar o seu atraso.

Ela toma coragem e abre a janela. Involuntariamente, vê os tórridos vultos desenhados na clara cortina da casa de sua vizinha. Ela fica feliz pelo casal ter resolvido o litígio de hoje de manhã. Pensa como é normal brigar ao início de um casamento. E é tomada de assalto pela recordação dela e de seu marido nesse mesmo período. E das juras de amor feitas outrora pelo casal. Iguaizinhas àquelas que rivalizavam com os chiados emitidos pelo rádio.

Dá graças ao seu deus quando vê que a sombra que percorre a escuridão da sua rua vai tomando formas e cores até revelar que é o seu marido. Ela fecha a janela. Aumenta só um pouco o volume do rádio. Algo na música que tocava aliado à visão de desavisada voyeur do casal de amantes evocou algo nela que não sentia há tempos.

Ela sorri.

Ele abre a porta, de modo desajeitado. Despenteado. Uma miríade de odores distintos que não haviam saído com ele daquela casa. Um botão da sua camisa está arrancado.

Enquanto ela celebrava o seu retorno, ele simplesmente gritava. Vociferações destituídas de sentido. Queixou-se do fato dela ainda estar acordada. E, ironicamente, quanto mais alto ele esbravejava, mais doce era o tom de voz dela.

O filho mais novo abriu os olhos, mas permaneceu encolhido em seu recosto. Grunhia. Gemia. Até não conseguir evitar o choro, ao ver sua genitora ser esmurrada pelo próprio pai. Um choro que tornou-se, subitamente, um agudo urro primal.

Ele a esbofeteava sem dó. Berrava com todo o seu ser. Ela apanhava calada. O róseo da pele ganhava o escarlate. O escarlate deu lugar ao púrpura. Seu corpo ganhou o chão. O filho mais velho estava escondido, à espreita. Num lance de segundos, correu em direção à sala, resgatou seu irmão e correu para o quarto.

Após saciar seus instintos brutais, em meio a resmungos, ele jogava suas roupas pela casa até desabar na rangente cama de casal.

Após recuperar-se, ela corre para o espelho do banheiro. Soluça. Tampa a boca com a mão.

Dirige-se ao corredor, em busca de concluir o que intencionava fazer desde a hora em que ela o viu. Um pensamento que não a largou mesmo em meio à surra, o choro do seu filho mais novo e aflição de seu filho mais velho:

Pregar um novo botão à camisa do marido.

Apanhou linha, agulha e um botão novo. Acendeu a luz da cozinha e sentou-se à mesa. Ao lado, o seu rádio. Após uma terna canção sobre amores eternos, o locutor, como se falasse diretamente a ela, profere um lúgubre discurso sobre as paixões e avisa que aquele será o último bloco de músicas da programação.

A agulha acidentalmente perfura seu dedo. Um pequeno fio de sangue se envereda às curvas de sua impressão digital. E como se isso pudesse autorizá-la a fazê-lo, ela chora. Copiosa. Afluente.

E ela se abraça à camisa encharcada de aguardente, colônias femininas e cigarro. E chora. E se pergunta do porquê disso acontecer.

Seu fiel locutor se despede. Os chiados, enfim, vencem a contenda e imperam sobre o aparelho. Ela desliga o rádio. Dobra a camisa do uniforme sobre a mesa de centro da sala.

Chega ao quarto. Estuda o que sobrou de espaço na cama e tenta preenchê-lo, soturna como uma felina, para não perturbar o marido. E dorme.

Triste fim o da mulher perfeita. Lava, passa, cozinha, ama, apanha...

E ainda tem que acordar cedo.


Carpe Noctem. Amo vocês.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Rosa-dos-ventos.

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Now playing on iTunes: Foo Fighters - Virginia Moon
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Querer alguém pode ser tétrica dúvida. Envolve variáveis que juramos que controlamos. Posamos de senhores das vontades, lordes do nosso coração.

E ignoramos a involuntariedade do supracitado músculo.

Querer alguém pode ser cética lástima. Encontrar motivos sólidos para omitir seu apreço ao receptáculo de tamanha adoração garante segurança frente a prováveis frustrações.

E ignoramos que amor sem coragem não dá chance aos finais felizes.

Querer alguém pode ser sôfrega dívida. Sacrificamos nosso amor-próprio em nome do amor de outrem que lhe toma por alvo. Achamos isso lindo.

E ignoramos quão pútrido é escravizar os sentimentos de alguém.

Querer alguém pode ser lépida lágrima. Daquela que surge, lesta. Quando nossa mão encontra, inegável, a mão da pessoa amada.

E ignoramos qualquer intempérie, qualquer consternação. É o preço a ser pago pelos ditosos amantes.


Carpe Noctem. Amo vocês.

terça-feira, 26 de maio de 2009

O décimo-quinto verso do soneto.

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Now playing on iTunes: Late! - Winnebago
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Entrego-me
em frente,
versos
e prosa.

E eu, tu, eles,
nós e o mundo
parecemos não ter
o mesmo idioma

Mas esse é
o meu vício:
Não largo
tua língua.

Quanto pesa?
Menos do que dura.
Quanto dura?
Menos do que vale.

(Toda essa riqueza
e mesmo assim
às vezes te encontro
em rimas tão pobres...)

Em boa métrica
e em certa medida
há duplo sentido
em tua sinestesia.


Carpe Noctem. Amo vocês.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Green leaves.

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Now playing on iTunes: Paul McCartney - How Kind Of You
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Deixe-me perceber
o quanto o teu sorriso
me é caro.

Deixe-me embebedar,
pensar o quanto
lhe quero distante.

Deixe-me lembrar
que não há culpa, sua,
em nada que penso.

Deixe-me lembrar
da história que, torta
ainda sim é nossa.

Deixe-me arrepender
de todos os momentos
em que não lhe quis.

Deixe-me livre,
inconstante,
autêntico,
pesaroso,
alerta,
inseguro,
medroso,
entregue,
viciado,
seu...

...Mas,
por favor,
não me deixe.


Carpe Noctem. Amo vocês.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

At the Mercy.

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Now playing on iTunes: Rage Against The Machine - Renegades of Funk
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Canto torto.
Tordo a agonizar.
Morte iminente.
Urgência de gritar.

Em alto som,
tudo aquilo
que não aprendi
a traduzir.

(Mas sinto, com tanta força.)

Dói em carne
o que sei
que não existe
enquanto carne.

Arde.

A.
O travesseiro
mais ajuda
que atrapalha.

Embora
o mundo insista
em atrapalhar
o travesseiro.


Carpe Noctem. Amo vocês.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Dentre tantas outras cousas.

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Now playing on iTunes: Altemar Dutra - Sentimental Demais
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Quando criança, havia um velho homem que me agraciava uma grande lição por dia. Com seu vigor adolescente, não ficava quieto por um segundo. Lavava, varria, subia telhado, regava suas plantas, estudava, fazia suas anotações e ainda tinha tempo de ser inegavelmente paciente, carinhoso e atencioso.

Em meio àquelas tardes preguiçosas, entre uma aula de História e outra, com seu português perfeito em grafia e dicção, ele contava-me de suas viagens pelos mares e ensinava-me sobre a importância de olhar nos olhos de alguém, como um sinal de honra, respeito e sinceridade. Ensinou-me também que "ambição" era uma palavra por muitos maldita. Que, sem ela, ainda estaríamos habitando cavernas.

Não concordava com tudo o que proferia... Mas, ao meu ver, era esse o sinal de que eu finalmente estava aprendendo a ser adulto.

Hoje, a criança envelheceu. Saudosa da época em que dispunha de todo aquele tempo livre para ficar somente ali. Ao lado dele. E ele continua lá, regando suas plantas, lendo os seus livros e fazendo suas anotações, me chamando de "descarado" toda vez em faço minhas esporádicas visitas.

Por uma questão de vida-real, não faço nada além de lamentar a relativa distância. O que não quer dizer que ele não esteja sempre comigo.

Mesmo ambicionando isso, não pude olhá-lo nos olhos hoje. Tive que contentar-me com um simples telefonema (e, como usual, minhas felicitações duraram bem menos do que seus conselhos reiterados. Ele sempre questiona o que foi que fiz atinente aos conselhos de nossa última conversa).

Mas meu coração está contigo.


Parabéns, Vovô. Obrigado por manter teu amor tão Leal quanto teu nome.


Carpe Diem. Amo você.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

D.O.A.

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Now playing on iTunes: Dave Matthews - So Damn Lucky
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Nunca tive medo de ondas grandes. Nem quando eu era muito novo.

Lembro que o infante que eu era (mais) desafiava as grandes marés sem cabelo, em busca do caos que eram suas consequências. De uma hora para outra, eu não era mais o senhor dos meus rumos.

E... por conta disso, ou, como preparação a isso, minha vida atua como um sem-fim de ondas sem rumo. Uma maré que me joga à berma, relega-me o estirâncio ou mantém-me ao fundo. Não importa.

Que ela venha, tal o tsunami que costuma ser.

Se continuo na crista ou me enterro na areia? É claro que depende do mar. Como também depende da atitude que tomo e da postura que assumo quando eu a vejo...

...e me atrevo a quebrar a arrebentação.


Carpe Noctem. Amo vocês.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Ueshiba.

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Now playing on iTunes: Cartola - Amor Proibido
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Certa feita, durante uma aula de Aikido, o sensei pediu para que treinássemos quedas. Pura e simplesmente. E num ritmo bastante puxado: levantávamos-nos, preparávamos a posição ideal, caíamos e levantávamos novamente. Num determinado momento, enquanto estávamos no chão, o sensei ordenava que ficássemos ali. Parados. Deitados. Respirando. Durante dez segundos.

E assim fazíamos. Repetíamos o ciclo. Em determinados momentos, ele intervia sempre perguntando:

— O que vocês aprenderam com isso?

Todos nós, tentando alcançar a sabedoria da austera figura à nossa frente, dissertávamos sobre o poder da prática, a maturidade em saber cair e tantas outras coisas profundas sobre a doutrina, o quadrado-triângulo-círculo, o Universo e lá vai. Ele assumia uma feição desdenhosa, olhava para cima e, serenamente, dizia:

— Repitam.

E lá íamos nós, a repetir o ciclo, decepcionados com nós mesmos, a perguntar qual foi a aula que a perdemos que tinha o macete p’ra responder essa pergunta.

Após dezenas de séries e repetições, ele pediu para que ficássemos em posição cerimonial. Suados, esbaforidos. Derrotados.

Ele perguntou novamente. Nós respondemos novamente. Ele sorriu e disse:

— Vocês não aprenderam a valorizar os dez segundos de descanso entre uma série e outra?

O aprendizado, simples e poderoso, fez-se percebido entre todos. Era unânime.

E isso é o bonito do Aikido. A lição já estava dentro de nós.

Faltava apenas alcançá-la.


Carpe Noctem. Amo vocês.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

É mais bonito lembrar que hoje é Dia dos Museus.

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Now playing on iTunes: Linkin Park - Bleed It Out
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(Breno Machado / Tadeu Mattos)


Mantenham esses loucos presos!

Venho, em nome da normalidade, reclamar nossa luta pela harmonia social e bons padrões de comportamento. Nossa sociedade brigou incansavelmente para conseguir limpar-se e constituir-se digna, com pessoas de boa vontade e totais condições de respeito aos bons costumes, que necessito manifestar-me contra o absurdo que vêm chamando de luta.

Estamos aqui, em nome da manutenção da felicidade advinda da árdua batalha quotidiana, externar nossa indignação ante esse grupo inconsequente, que hasteia a duvidosa bandeira da igualdade, denominado “Movimento Antimanicomial”.

Esse discurso de inclusão é assustador. Como poderemos sair com nossa esposa e filhos num domingo ensolarado correndo o risco de encontrar um louco na rua? Como posso ir a um restaurante com a minha amante sabendo que uma das garçonetes pode ser uma recém saída de um hospício? Essas pessoas deveriam pensar na repercussão de seus atos e ideias antes de sair abraçadas a malucos e clamando para que eles saiam de suas jaulas.

Conclamo as bases que fazem o rosto de nossa modernidade – essa, tão inteligente e promissora. Senhores Psiquiatras, advogados, políticos, todos os defensores do progresso de nosso mundo, onde as pessoas podem viver tranquilas em seus lares e trabalhos.


Como podemos permitir que esses insanos saiam às ruas? Eles não são capazes de entender o significado de um trabalho honesto e vigoroso, que tanto significa em nossas vidas. Um trabalho tão gratificante que sacrificamos, por vezes, o bem estar de nossos familiares, não dando conta da própria existência de nossos filhos. Mas nós, pessoas normais, conseguimos entender que é para o bem, e que só o sacrifício vai nos levar à perfeição.

Como aceitar, meus caros, ao nosso redor, criaturas com uma vida sem limites sexuais, parecendo animais que acasalam por prazer e vontade momentânea, expondo de forma vil nossas vontades mais íntimas e sórdidas? Como seria asquerosa a vida sem a repressão!

Não existe argumento válido para desbancar um sistema que há séculos logra êxito. Não há como nos convencer que, após a solidificação de um sistema seguro e os avanços da medicina moderna, abandonar tudo isso e viver à sombra de um futuro incerto seja a melhor alternativa. Que os nomes “transtorno”, “doença”, “inadequação”, “desvio”, tão qualificadamente inseridos nos diagnósticos de nossa ciência psicológica nos soem como verdade e possamos manter os errados longe de nós.

Essa “Luta antimanicomial” deveria, sim, ser denominada “Conspiração antimanicomial”. Até quando ficaremos cegos até percebermos que defender tais ideias biltres é cavar a cova do nível de sociedade que passamos séculos para consolidar? Será tarde demais quando percebermos que estamos inseridos num pandemônio arquitetado por pessoas doentes?

Senhores distintos, pessoas de bem, pais e mães de família! Conclamo a todos para sairmos às ruas e fazer a nossa voz ser ouvida! Vamos dizer “não” aos pretensos defensores dessa anarquia velada! Façamos valer a força dos valores por nós arraigados! Se esses loucos (literalmente) creem que podem combater nossos direitos adquiridos, façamos o mesmo! Que fundemos o Movimento Anti-Antimanicomial!


Lutemos pela estabilidade. Lutemos para que possamos matar um mendigo ou um índio que nos incomoda, para que possamos jogar nossos filhos do alto de prédios, comprar nossa maconha e esquecer as pequenas mãos infantis que seguram as armas do tráfico, para que tenhamos nossos carros e computadores, nossas armas, e nossa poluição pois nos alimentamos dela hoje. Peguemos em armas para assassinar em nome de nosso Deus, em nome dos direitos humanos e em nome de nossos sobrenomes, pois sabemos o que é bom e o que é mau. Em nome de nossa pátria. Ora, os loucos não têm pátria, não entendem o significado de sujar as mãos de sangue para vencer o inimigo.

Peguemos as armas que a ciência nos dá em nome de nossa mediocridade e defendamos a bandeira da normalidade

Nossa liberdade depende de mantê-los presos.


Carpe Noctem. Enlouqueçamos.


P.S: Agradeço ao meu irmão, Tadeu (webmaster do blog Demo e Bonus Track), pelo convite feito. Amo você. E mande essa "reforma moral" p'ra puta que o pariu.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Ensaios Sobre as Paixões (10)

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Ato X: Pathos-Pecado


Se errar e pedir perdão
é provar que mereço um Céu
que eu abrevie a minha culpa
e antecipe o meu êxtase.

Teu corpo de imagem em altar
arrepia qualquer asceta
ebule, profana, excita
a mente de qualquer cristão.

Tocar todo e qualquer milímetro
de tua cálida candura
Merece cada chibatada penitente.

Teu beijo arrebatador
vale tantos padres-nossos
o padre quiser sentenciar.


Carpe Noctem. Amo vocês.

Ensaios Sobre as Paixões (9)

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Ato IX: Pathos-Patologia


[Incubação]
Quatro da manhã.
Noite sem lua.
Ela encontrou meus olhos.
E beijou-me.

[Prodrômico]
Sentia os sintomas.
Era inegável.
Ela instalou-se em meu peito.
Eu já a transmitia pelo ar.

[Estado]
Sudorese, taquicardia,
delírios, alucinações,
saudade de doer o peito –
Eu já era dela.

[Resolução]
Outro beijo,
sem restrições,
encerra o ciclo.
(O bálsamo requer o veneno.)


Carpe Noctem. Amo vocês.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Ensaios Sobre as Paixões (8)

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Ato VIII: Pathos-Catástrofe


Tantos nomes elas tiveram,
Tantos nomes elas me deram
Tanta coisa elas disseram
e não me diziam nada

Tenho todas em mãos.
Tantas promessas faziam
Tão pouco de mim exigiam
que não sentia toque algum.

E é por essa,
a que não tenho,
Que tenho isso?

Inédita ruína,
Karma filho-da-puta -
Enfim sinto o que evoquei.


Carpe Noctem. Amo vocês.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Nada, (2)


Nada que me sobressalte ou exaspere.

Nada que me incorra ou incrimine.

Que me faça beijar. Ou cuspir. Ou correr.

Quero algo para sentir medo. Sentir muito.

Mas tudo o que encontro é pouco.

(Tudo o que encontro é nada.)

Como anda o meu dia?

Nada. Nada anda.

Nada que tire o fôlego de alguém. Nem susto nem êxtase.

Pensando bem... Nada, não.


Carpe Noctem. Amo vocês.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Ou dá ou desce.

A Igreja Universal do Reino de Deus, de acordo com os seus fiéis, é difamada por ser uma instituição que visa apenas o lucro à revelia da espiritualidade envolvida.

Nos fiéis eu não duvido, de coração. A religião, para quem crê em seus princípios, possui um notório poder renovador. É tábua de salvação, porto seguro, reaquece a chama da esperança frente a um futuro pouco confortante.

O que não me entra são os filhos da puta que gerenciam esse esquema. Sobretudo, a figura enojante do Bispo Edir Macedo.

Eu poderia passar laudas e laudas falando sobre esse grotesco indivíduo. Mas deixarei que o vídeo abaixo, uma reportagem do Jornal Nacional de mil-novecentos-e-William-Bonner-novo, fale por mim.

Com as palavras do próprio Bispo... Deem ou desçam.

Uma vergonha.



Bispo Macedo no Jornal Nacional
by cardoso


Vídeo extraído do Blog do Cardoso

Carpe Noctem. Amo vocês.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Sacro Cuore.


Bate em meu coração, junto a ele mesmo, uma vontade de externar sentimentos que me são tão íntimos, e ao mesmo tempo, tão notórios. Daquelas vontades que todo mundo sente, embora poucos saibam como proceder.

Uma vontade daquelas que me fazem querer ser simples como nunca fui. E ser simples é uma dádiva. De fazer-me ser compreendido mesmo por aqueles que, imersos em seus próprios sentimentos inomináveis, pouco ou nada têm a haver com isso. Que o véu rasgasse e não sobrasse outra alternativa a não ser encarar a verdade que está contida nesse sentir.

À revelia disso ser desnecessário a alguns, hiperbólico a outros e incômodo a tantos mais.


Carpe Noctem. Amo vocês.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

My Poor Brain.


A contragosto
rasgo o meu peito,
escondo o meu medo
e mostro o meu rosto.

Tomo coragem,
ignoro um Deus
e uso os meus
vícios de linguagem.


Carpe Noctem. Amo vocês.

Insucedido Cindido.


É difícil ser deliberadamente esquizofrênico nesses casos em que quase qualquer coisa é capaz de trazer a realidade à tona. Um nome. Um detalhe de fotografia. Um comentário pertinente, com todo o direito do mundo.

Às nossas parcas e ditas-sãs percepções existem, sim, tristezas irrefutáveis.


Carpe Noctem. Amo vocês.

Nós, os Românticos.


Há cinco anos, ganhei de presente de uma linda menininha ruiva o excerto de um texto. Ao escarafunchar meus transcritos, deparei-me com ele e fiquei maravilhado com uma miríade de fenômenos distintos - incluindo a beleza das palavras contidas.

Tentando desvendar a autora desse excerto deparo-me - Surpreso - com o texto integral. Igualmente belo.

Ofereço a todos essa preciosidade prosaico-poética. Qual foi o trecho que foi-me presenteado? Creio que mantém a beleza do presente manter isso em segredo.

Beijos, Linda Menininha Ruiva.


P.S: Se você souber quem é a autora (ou se a autoria desse texto for sua), por favor, comente aqui no blog e eu darei os devidos créditos.


Carpe Noctem. Amo vocês.



E tem horas que todas as boas intenções do mundo não são suficientes, porque a gente nunca vai saber como agir certo. Não adianta o coração estar no lugar certo, porque sempre as palavras saem erradas, e a gente tropeça no ar e dá de cara com uma parede de negação. E porra, dói. Minha cabeça deveria estar calejada, já, de tanto dar de cara com essa parede. Mas parece que não dá. Só prova que ser cabeça-dura não dói menos. A teimosia ainda não se externalizou o suficiente para me proteger de dores metafóricas, parece. Mas tudo bem.

Às vezes fico rezando para que chegue o dia que os calos cheguem. O dia para que a insensibilidade me impeça de continuar tentando salvar o mundo. Esse tipo de idealismo cego não me faz bem. O romanticismo infindável menos ainda.

Me recuso a acreditar em certas coisas. Me recuso a sentar e assistir às poucas coisas que me dão esperança saíndo do meu alcance e se tornando exatamente aquilo contra qual a gente tanto lutou e esperneou num passado não tão distante.

Já teve aquela sensação de andar pela rua, sem preocupações, olhando as estrelas, esperando que a qualquer segundo o céu fosse desabar numa explosão de estrelas, e os prédios fossem cair à nossa volta, porque a única coisa realmente importante nesse mundo inteiro fosse a gente estar de mãos dadas no meio disso tudo? Eu sei que você já teve, eu estava lá. Se os prédios de fato não caíram, foi mero acaso, ou talvez a engenharia moderna. Mas nunca vou saber se caíram ou não. Tinha coisas muito mais importantes na minha cabeça. Do tipo como iríamos envelhecer numa casa cheia de livros, com um sofá pra ficarmos um em cada ponta lendo, com as pernas cruzadas no meio. E sobre ter um gato, que iria ficar pendurado no seu ombro, ou deitado na minha barriga. E como nunca precisamos falar, mas talvez se tivessemos falado, ainda estariamos vivendo aquela felicidade que desconhecia o amanhã. E sobre como talvez eu teria descoberto antes que era só eu estava sentindo aquilo tudo. Como talvez algum dia eu vá parar de sentir isso toda vez que me apaixono, e como só de pensar que talvez vá chegar o dia em que eu não vou mais me apaixonar assim, me dá um vazio horrível.

Pra que viver num mundo onde os prédios só significam aglomerados de pessoas infelizes vivendo sob um mesmo teto sem cruzar olhares no elevador, ou muito menos palavras de consolo em noites chuvosas. Prédios, ruas, carros, barulhos, são nada mais do que um pano de fundo cinza, jogado ali para destacar como as nossas pequenas explosões de cores diárias são realmente coloridas. É saber que nossa pequena revolta é essa. Nós, os românticos, não temos mais lugar no mundo. Pouco a pouco, a gente morre, em meio à um mar de dívidas, impostos e ônibus cheios. Mas enquanto isso não acontece comigo, eu vou lá, passear pela rua. E se você vê uma garota dançando no farol e cantandinho junto com a música, é muito capaz que seja eu. E se eu te desejar um bom dia, não estranhe. É de coração.

Eu queria que as pessoas entendessem tudo, mas às vezes é difícil acreditar que elas consigam. Não que isso já tenha, nem vá, me impedir de ao menos tentar. Vocês também deveriam. Tentar, digo. Pelo bem do pouco que resta da esperança.


Em tempo: o texto fora extraído do blog Meus Delírios, da catarinense Júlia Schramm.

Für meine Blume (2).


"Venha e irei abrigar-te e às cores dessas belas contusões. Tudo esvaece com o tempo, é verdade.

Desejei receber outra apunhalada disfarçada. Isso foi uma mudança de planos tua?

É impossível. Não consigo excluir-te. Nunca saberás que estou desfazendo-me de ti? Senta-te e veja todos os teus estados de espírito.

Teus olhos ainda rememoram-me anjos que pairam acima. Olhos que não conseguem mudar a ponto de cegar-te da tristeza.

Agora que encontrei minha recompensa, jogo-a longe. Dividi minha parte dela contigo."


(Dave Grohl, Pat Smear, Nate Mendel - Hey, Johnny Park!)


Carpe Noctem. Amo você.

New Way Home.


O ser humano às vezes me irrita. Feliz ou infelizmente eles têm sido o foco da discussão que embasa meu comentário anterior.

Parece que, quanto mais próximos estão de você (no âmbito geográfico), mais estão distantes. O lugar, então parece um jogo cartesianamente ilógico. Olhando de um ponto-de-vista psicanalítico, o Doutor parecia ter razão quando disse que, para eles, as relações são um doentio esquema de projeção/deslocamento.

Não que eu esteja abstendo-me de nenhuma culpa, achando que estou fora do esquema. O que me intriga é o fato deles serem uma instituição caquética, que, em certa medida, ainda sobrevive.

Quer dizer... o discurso de união ser um motivo intrínseco (termo que vi em Verdugo) não me parece coerente. Prova disso é a tônica, encontrada no seio de uma fração deles, de estabelecer iguais como parâmetro (denegritivo) de comparação. São chacais que atacam justamente o membro do gado que está mais distante. Isso parece-me doentio se levarmos em consideração que certas opiniões, positivas ou negativas, que tomo(ou tomam por mim) ser tão infundadas quanto as que quaisquer pessoas que nunca se viram na vida tomariam. E reitero o termo “doentio” em ver que não é por simples falta de oportunidades de se conhecer que isso acontece. Denigrem por satisfação. “Os meus estão na lama — Mas os dele estão ainda mais afundados.”

O pior é ver que há certos locais em que as coisas amenizam, mas não se perdem — Mesmo com as oportunidades de se conhecer aumentando!

Irrita. Todo mundo é uma ilha, tudo bem. Mas o lugar parece um núcleo de subjetividades individuais muito mais poderoso.

Unimo-nos de forma sã por motivos que nos uniriam a quaisquer pessoas: Mães, amigos, colegas de classe, vizinhos ou o porteiro do hotel. Isso não parece deslocado?


Carpe Noctem. Amo vocês.

Persigo.


Deixa-me em paz
deixando-me a certeza
de que ainda sofro
ao ver-te longe demais.


Carpe Noctem. Amo vocês.